TRATADO DA CASTIDADE
Bem-aventurados os puros.
(SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO)
§ I.
EXCELÊNCIA DA CASTIDADE
Ninguém melhor que o Espírito Santo saberá apreciar o valor da
castidade. Ora, Ele diz: "Tudo o que se estima não pode ser comparado com
uma alma continente" (Ecli 26, 20), isto é, todas as riquezas da terra,
todas as honras, todas as dignidades, não lhe são comparáveis. Santo Efrém
chama a castidade de "a vida do espírito"; São Pedro Damião, "a
rainha das virtudes"; e São Cipriano diz que, por meio dela, se alcançam
os triunfos mais esplêndidos. Quem supera o vício contrário à castidade,
facilmente triunfará de todos os mais; quem, pelo contrário, se deixa dominar
pela impureza, facilmente cairá em muitos outro vícios e far-se-á réu de ódio,
injustiça, sacrilégio, etc.
A castidade faz do homem um anjo. "Ó castidade, exclama Santo
Efrém (De cast.), tu fazes o homem semelhante aos anjos". Essa comparação
é muito acertada, pois os anjos vivem isentos de todos os deleites carnais;
eles são puros por natureza; as almas castas, por virtude. "Pelo mérito
desta virtude, diz Cassiano (De Coen. Int., 1. 6, c. 6), assemelham-se os
homens aos anjos"; e São Bernardo (De mor. et off., ep., c. 3): "O
homem casto difere do anjo não em razão da virtude, mas da bem-aventurança; se
a castidade do anjo é mais ditosa, a do homem é mais intrépida". "A
castidade torna o homem semelhante ao próprio Deus, que é um puro
espírito", afirma São Basílio (De ver. virg.).
O Verbo Eterno, vindo a este mundo, escolheu para Sua Mãe uma Virgem,
para pai adotivo um virgem, para precursor um virgem, e a São João Evangelista
amou com predileção porque era virgem, e, por isso, confiou-lhe Sua santa Mãe,
da mesma forma como entrega ao sacerdote, por causa de sua castidade, a santa
Igreja e Sua própria Pessoa.
Com toda a razão, pois, exclama o grande doutor da Igreja, Santo
Atanásio (De virg.): 'Ó
santa pureza, és o templo do Espírito Santo, a vida dos Anjos e a coroa dos
Santos!".
Grande, portanto, é a excelência da castidade; mas também terrível
é a guerra que a carne nos declara para no-la roubar. Nossa carne é a arma mais
poderosa que possui o demônio para nos escravizar; é, por isso, coisa muito
rara sair-se ileso ou mesmo vencedor deste combate. Santo Agostinho diz (Serm.
293): "O combate pela castidade é o mais renhido de todos: ele repete-se
cotidianamente, e a vitória é rara". "Quantos infelizes que passaram
anos na solidão, exclama São Lourenço Justiniano, em orações, jejuns e
mortificações, não se deixaram levar, finalmente, pela concupiscência da carne,
abandonaram a vida devota da solidão e perderam, com a castidade, o próprio
Deus!"
Por isso, todos os que desejam conservar a virtude da castidade
devem ter suma cautela: "É impossível que te conserves casto, diz São
Carlos Borromeu, se não vigiares continuamente sobre ti mesmo, pois negligência
traz consigo mui facilmente a perda da castidade".